(Para um amiga ruivinha, que eu acredito que tinja o cabelo de crush só porque é a cor do Partidão - acho que um dia ela vai liderar uma nova coluna Prestes)
O Casaco de Marx - Roupas, Memória, Dor é pequenérrimo no tamanho (cabe numa minaudière), mas grande de fôlego, de insight e de poesia (obrigada, Rosane, por me indicar essa leitura muitos anos atrás!). Escrito por Peter Stallybrass, professor de Inglês e Literatura Comparada da Universidade da Pensilvânia, tem dois textos: A Vida Social das Coisas: roupas, memórias, dor e O Casaco de Marx. O primeiro é uma constatação linda sobre a importância das roupas como objeto não de status ou bláblá, mas de lembrança de si mesmo e de gente querida. O segundo - e é esse que eu dedico aqui para minha amiga vermelha - conta a história de um casaco de lã que Karl Marx, vivendo em Londres, usa não só para protegê-lo do frio, mas como mercadoria (o X da questão em O Capital). Stallybrass escreve:
"(...) O ano de 1852 foi mais um ano catastrófico para o lar de Marx. Nos primeiros meses do ano, Marx estava escrevendo O Dezoito de Brumário, uma tentativa para explicar os fracassos das revoluções de 1848 e o triunfo da reação. De 2 a 24 de janeiro ele esteve doente na cama, escrevendo com a maior das dificuldades. Mas ele tinha que escrever, uma vez que, juntamente com as doações de Engels e com aquilo que podia penhorar, essa atividade constituía a fonte de renda do lar, uma lar constituído de quatro crianças e três adultos. Na verdade, não se tratava apenas do fato de que Marx tinha que escrever; ele tinha que escrever jornalismo. Em junho de 1850, Marx tinha conseguido um passe de entrada para a sala de leitura do Museu Britânico e tinha começado a fazer a pesquisa que seria a base de O Capital. Mas para financiar esta pesquisa ele precisava escrever por dinheiro. Além disso, de qualquer forma, durante sua doença, ele não podia mais ir ao Museu. Mas quando se recuperou, ele queria gastar pelo menos algum tempo na Biblioteca. Ele não pôde fazê-lo. A situação financeira tinha se tornado tão desesperadora que ele tinha não apenas perdido o crédito com o açougueiro e o verdureiro, mas tinha sido obrigado a penhorar o seu casaco de inverno. No dia 27 de fevereiro, ele escreveu a Engels: "Há uma semana cheguei ao agradável ponto no qual não posso sair por causa dos casacos que tive de penhorar". Sem seu casaco de inverno, ele não podia ir ao Museu Britânico. Não penso que haja uma resposta simples para a causa pela qual ele não podia ir. Sem dúvida, não era aconselhável que um homem doente enfrentasse um inverno inglês sem um casaco de inverno. Mas os fatores sociais ideológicos eram, provavelmente, tão importantes quanto o frio. O salão de leitura não aceitava simplesmente qualquer um que chegasse a partir das ruas e um homem sem um casaco, mesmo que tivesse um passe de entrada, era simplesmente qualquer um. Sem seu casaco, Marx não estava, em uma expressão cuja força é difícil de reproduzir, "vestido em condições em que pudesse ser visto".
O casaco de inverno de Marx estava destinado a entrar e a sair da loja de penhores durante todos os anos 1850 e o início dos anos 1860. E seu casaco determinava diretamente que trabalho ele podia fazer ou não. Se seu casaco estivesse na loja de penhores durante o inverno ele não podia ir ao Museu Britânico. Se ele não pudesse ir ao Museu Britânico, ele não podia fazer a pesquisa para O Capital. As roupas que Marx vestia determinavam assim o que ele escrevia. (...)"
Na biografia de Maysa, lançada no ano passado, o jornalista Lira Neto conta uma história bem parecida envolvendo a cantora fossa-nova:
"(...) Como agravante, as finanças do casal não iam bem. Transações mal-sucedidas fizeram com que Miguel Azanza dilapidasse parte do patrimônio da família, deixando escorrer entre os dedos o que obtivera com a venda de ações da Star, fábrica de pistolas que fornecia armamento para a guarda civil espanhola e da qual seu pai era um dos maiores acionistas. para contornar a situação, Maysa, que ainda se ressentia de ter visto pilhas de dinheiro descendo pelo ralo da Guelmay, mais uma vez precisou penhorar o anel de brilhantes que havia ganho no noivado com André Matarazzo.
Quando não lhes restava outra alternativa senão rir das próprias adversidades, figiam se divertir, tentando adivinhar o paradeiro da jóia, a quem apelidaram de El Niño. Ele poderia estar na feira, talvez na companhia telefônica ou, quem sabe, nas mãos do senhorio a quem deviam aluguel. O anel propriamente dito jazia no cofre do banco de penhores. O jogo consistia em saber qual das dívidas recentes ele havia ajudado a cobrir. (...)"
ps.: nunca subestime o valor de uma roupa.
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5 comentários:
Eu estava com saudades dos teus posts, achei que tinhas abandonado;
Viva o casaco!!
"De pé, ó vitimas da fome..." rs.
Welcome back! Que saudades. Otimo post que estimula como encaramos a moda e nós dentro dela.
adorei fossa nova!!!
é isso aí, vamos penhorar nossas idéias por aqui!!!
quem sabe a gente consegue algo do mundo em troca!!!!
Que bom que vc esta de volta! Adorei os dois trechos, o do Marx me deixou bem pensativa...bjs!
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