domingo, 27 de abril de 2008
Pierre Bourdieu III
Chanel se esconde na sua famosa escada de espelhos do apartamento em Paris para espiar seu desfile, ignorando que Frank Howat registrou o momento. 1958
"É essa contradição que faz surgir Ramon Esparza, sucessor de Gaston Berthelot à sucessão de Chanel, quando ele exige plenos poderes "incluindo o de falar quando tiver vontade". Falar, isto é, existir como pessoa e obter os meios para se tornar uma personagem com uma marca, palavras, manias, em suma, tudo o que compunha Chanel, o carisma de Chanel, e que nos força a formular a pergunta: Como será possível substituir Chanel? Exatamente o que os jornalistas, que haviam contribuído para a produção da crença coletiva, descrevem retrospectivamente com um objetivismo redutor:
"Privado de sua vedete, o cenário perdeu toda sua magia. No fundo, todo este verniz preto e ouro era um pouco sinistro, e essas corças de bronze - dignas de figurarem nas salas do museu Petit Palais - representam justamente o notável pesar da felicidade de ter cachorros. Mas Chanel detestava cachorros. Trancamos a porta e, à nossa frente, a célebre escadaria de espelhos. Era aí, Galeria dos Espelhos e Sala do Trono, que Chanel - multiplicada por cem, sentada em um degrau, com a cabeça coberta pelo seu eterno chapéu de palha -, controlava, nos dias de apresentação das coleções, as ausências e abstenções. A seus pés, espalhados pelo tapete bege - já gasto -, os fiéis em uniforme de gala - tweeds creme e botões dourados - aplaudiam com vigor (...). Mademoiselle, enclausurada há vinte anos em um monólogo, do qual explodiam na superfície, em forma de bolhas, vitupérios e fórmulas mordazes, enquanto desliza sub-repticamente o lento fluxo de lembranças. Mademoiselle não suportava interrupções. A religião do pequeno tailleur. Com seus ritos: mangas cortadas por três vezes, tesouras sacrificadoras, estréias banhadas em lágrimas. Seus milagres: pela primeira vez, foi possível usar um terno dez anos seguidos sem ter ficado demodé, pois Chanel, que ditava a moda, decidira para o tempo. E um evangelho: 'É preciso sempre... Detesto as mulheres que...', etc..." Mais comment peut-on remplacer Chanel?, ELLE, 23 de julho de 1973
Por fim, basta citar as primeiras palavras que Ramon Esparza dirigiu aos jornalistas: "Não, na próxima terça-feira não ficarei na escadaria. Aliás, não quero ver ninguém. A tradição? Fui contratado pela empresa Chanel para fazer funcionar a maison e não para retomar a representação de um papel." ibid.
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4 comentários:
Seu elogio vale muito pra mim! Merci!
Aprecio porque acho o seu texto o melhor de moda do Brasil, simples assim!
Que tal nesta encarnação mesmo?? : )
Mon amour!Vc pode imagina como foi meu primeiro fechamento por aí, não é mesmo? Sem entender direito os códigos,aprendendo tudo em tão pouco tempo... Mais de 20 páginas depois, agora respirando quase aliviado...Mas prometo ir te visitar na semana que vem. Bisous Bisous
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